segunda-feira, 27 de setembro de 2010

DIÁRIO DE UMA BUSCA AMOROSA

Era pra ser sexta-feira, dia 24. Mas só deu na segunda, madruga, dia 27

Coisas estranhas acontecem no meu reino interno da Dinamarca. Depois de matar a primeira reunião editorial tardia deste Guia de Cego, cabulando também sessões do festival pra tentar uma quixotesca conquista de uma paixão morena, num primeiro encontro na boate Six, lá na rua das Marrecas (afinal, meu Galo tá indo pra segunda divisão e exijo, pois, a contrapartida da sorte no amor), recebo um email inusitado. E da VideoFilmes e companhia! É, estou tirando onda. Pensando bem, não passa de uma marolinha, mas que se configurou numa chance extraordinária d'eu camuflá-la em tsunami aos olhos oblíquos da minha Chapeuzinho Vermelho.
Eis a mensagem: "Tambeline Filmes, Les Films du Poisson e Videofilmes convidam para a Sessão de Gala (ai, meu Galo) da Première Brasil do filme (...)"

corte narrativo-mnemônico: nesta hora pensei que, sei lá, o João Moreira Salles olhou em alguma lista escusa e mandou o recado: 'O Mauro Reis tem que ir!'. E que, claro, o tal era meu homônimo mais famoso (podem digitar no google):
um ator.
Pornô.
Gay.

Ou seja, seria barrado na entrada e minhas recém-nascidas penas de pavão defenestradas diante da Chapeuzinho Vermelho tropical. Ai, meus pecados!
Mas a mensagem assim continuava: "(...)'diário de uma busca', de Flavia Castro. Sábado, dia 25 de setembro, às 17horas, Cine Odeon"
Uau! Nossa, que gesto generoso. Flavia e eu (hora do auto-merchandising) vencemos um edital de roteiro de longa da Secretaria Estadual de Cultura e, sorte minha, trocamos alguns emails na tentativa de desbravarmos a burocracia de uma prestação de contas. E lá estava ela, prestando esse imenso ato de carinho pro mané aqui.
Oba, dava pra continuar com meu propósito de mentir descaradamente pra minha amada vítima: eu era o tal! Mas, carambolas, quem teria a idéia de, num segundo encontro amoroso, levar sua pretendente pra assistir um documentário brasileiro? Só uma besta quadrada como eu, né. Tremi. Mas não dava pra regatear. Tava lá o tapete vermelho, cor do meu sangue pulsante de neuroses derrotistas, como uma língua a engolir meus sonhos de boa-venturança.
Vixi Maria! E a fila pra entrar parecia uma pororoca de vários afluentes. E eu e a Chapeuzinho ali, a deriva no festival deste Rio caudaloso. Quando finalmente desconfiamos nosso lugar na fila, nos raptam para uma foto promocional. Meu cabelo rasta é ímã pra esses micos. Beleza, pensei, meu naufrágio amoroso estará registrado. Lobo ao mar! Lobo ao mar!
Oh!, destino do Poseidon foi nos colocar em duas cadeiras laterais, nem tão sãos, mas salvos. E, gente! Aparece lá o meu ídolo, Eduardo Coutinho. Aponto pra Chapeuzinho o velhinho, que ela desconhece solenemente. Chega também o João Moreira Salles. Não aponto. Vai que a hipótese do Mauro Reis famoso se concretize?
E começa, antes, um curta de ficção. É... isso pode me ajudar a descontrair a Chapeuzinho. Mas, qual o que! Que nhaca era aquela? 'Simpatia do Limão', um curta antipático sobre uma cartomante farsante. Nunca vi nada tão ruim desde um outro curta também de cartomante, com o seguinte título imbecil: 'Bulbo: parte do eixo cerebrospinal, sede de importantes centros neurovegetativos, como o do centro de controle cardiorrespiratório", que, a propósito, eu escrevi e dirigi. Uma bosta.
Naufraguei-me mais uns centímetros na cadeira, reparando de soslaio o semblante nada animador da Chapeuzinho. Ainda mais quando aparece o personagem Rodrigão, 1 metro e oitenta de canastrice. Fico a imaginar o coitado do Coutinho sendo obrigado a ver aquele cabra marcado pra correr semi-nu, na praia. Eita!
Mas quem nos salva? Flávia Castro, novamente. Filme emocionante, corajoso, bonito e que, outra virtude inusitada, preserva minha tentativa de Don Juan da Carochinha.
De toda forma, pode ter sido por um fio. E fico cá a pensar se arrisco de novo minha possibilidade de amor durante o festival.
Ver ou não ver, eis o que nem sei se é questão.

Lobo Mauro

2 comentários:

  1. huahuahuahua!! Muito bom, nobre escritor...
    Só um afago no coração para acalmar o turbilhão de decepção do time que você escolheu amar. Aliás, a culpa não é minha hein. O algoz de ontem é o time que eu escolhi amar, mas eu não entrei em campo.

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  2. Pedro, Pedro, meu caro Pedro. Bem queria cantar: "Pára, Pedro. Pedro Páramo!" Mas ontem, com seu Grémio, só cabe "tinha um Pedro no meio do caminho, no meio do caminho tinha um Pedro, que com duas pedradas abriu um Galo na minha testa, terceiro olho que me fez vislumbrar que há luz no fim do túnel da segunda divisão."
    Intés, camarada!

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