segunda-feira, 27 de setembro de 2010

ESSE FILME NÃO É UM A UM

Nesse último domingo chuvoso não fui ao Maracanã. Tão pouco ao Engenhão, arena a que nos condenaram pelos próximos anos.
Guardei os foguetes, enrolei as bandeiras e caminhei bovinamente rumo ao cinema para assistir a... Mario Filho, o criador das multidões (de Oscar Maron).
O bom leitor já deve ter adivinhado que vira e mexe o futebol vai brotar nas entrelinhas de um blog que devia ser sobre cinema. Respeitamos as nossas verdadeiras obsessões.
Aos que nunca foram mordidos pelo bichinho do torcedor e acham todo esse engajamento ‘uma absurda perda de tempo dessa gente alienada’, peço desculpas pela profusão de metáforas boleiras que vão tomar conta do resto do texto. Não consegui resistir à óbvia tentação de fazer um paralelo entre a experiência da arquibancada e a da poltrona de cinema em um filme sobre o maior cronista da pelota.
Então, taí o que você queria (ou não)!
Primeira surpresa da partida. O jogo preliminar é melhor que o principal. O delicado e preciso curta da Andrea Capella foi bem mais interessante do que o longa que veio a seguir. Instantâneos é um sutil ensaio sobre a duração, o tempo e outras questões profundas que não cabem no raso desse meu texto que bate na canela. Deixo as boas críticas pra gente mais inteligente.
Quanto ao longa, meu amigo Roberto tem razão quando diz (inspirado no próprio Mário Filho) que uma partida de futebol pode entrar para a história pelos seus minutos finais. Mas acho que essa regra não vale pro cinema.
Durante toda a projeção de Mario Filho, a gente é obrigado a assistir a uma modorrenta narrativa feita de uma série de toquinhos laterais e recuos de bola que só um Parreira poderia se orgulhar de ter inventado. O filme gira, gira e não chega a lugar nenhum. A vontade na platéia era gritar: “Verticaliza, desgraçado!” “Chuta, pelamordeDeus!”
Aliás, se a gente pudesse gritar no cinema a coisa ia ficar bem mais divertida. “Bota um ponta, Oscar!”
Mas nem isso resolve. Quando o filme tenta alguma firula o negócio fica ainda mais estranho. É como se tivessem escalado o Denílson na seleção da Suíça. Não cola.
Na falta dos apupos da torcida, as cabeças pendentes nas cadeiras davam a medida do efeito do filme. Tudo fazia lembrar um tremendo zero a zero.
Eis que, já nos acréscimos, esperando o apito do juiz, surge o grande lance. O filme consegue, numa jogada improvável, reinventar o Fla-Flu do coração de Mario Filho. E as multidões despertaram já nos créditos finais.
Realmente genial e memorável. Mas o blasfemo filme de Maron contradiz a teologia boleira cujo Gênesis rodriguano adverte: o Fla-Flu acontece antes do nada. O Fla Flu começa 40 minutos antes do Big Bang. Não depois do juízo final.
Confesso que a deliciosa montagem sobre o verdadeiro time de coração do Mario Filho vai render uma boa conversa de boteco. Mas desconfio de um filme que funcionaria melhor numa edição dos grandes momentos da rodada. Com direito às boas piadas do Tadeu Schmidt e à ‘voz marcante de Léo Batista’.

Aurélio Aragão

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