quarta-feira, 3 de outubro de 2012

DO ESTÁCIO À NOVA IORQUE E VICE E VERSA

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Qual a relação entre o bairro do Estácio no Rio e Nova Iorque? Nenhuma, ou todas aquelas que a gente inventa. Na sexta passada fui assistir ao filme A Dama do Estácio de Eduardo Ades e de certa forma esbarrei na “grande maçã” no caminho do cinema. Sem ingresso para o filme e desolado pela própria estupidez dos que não conseguem ingresso, me encaminhei para a única alternativa, beber uns copos. Na solidão da encruzilhada entre os bares próximos ao Baile Charme e ao Teatro Rival, com os fãs de Death Metal, decidi ir até o Amarelinho na esperança de encontrar algum rosto amigo para repousar a frustração de não poder ver o filme.

Eis que lá encontro um casal de amigos que acabavam de descobrir que iriam passar um ano em Nova Iorque. Brindamos eufóricos o máximo de vinho possível e enquanto cantávamos New York, New York em trio desafinado, tomei coragem para tentar a sorte por ingresso na porta do cinema. Me despedi com ares de Fred Astaire tropical e saí em direção ao cinema entoando a estrofe da canção como um Frank Sinatra tísico. E como diz a canção - eu e meus sapatos vagabundos estão aqui para ficar! Surrupiei uns ingressos da produção do filme e me juntei à turba na porta do Odeon.

De resto posso dizer de imediato que o filme do Eduardo Ades é muito bonito. E ainda embalado na comparação esdrúxula entre o bairro carioca e a metrópole americana, me lembrei da imagem que um escritor uma vez cunhou ao chegar em Mahattan de navio, a de como seriam as ruínas daqueles arranha-céus daqui a mil anos. Bom, posso dizer que em relação ao Estácio pude experimentar suas ruínas marcadas no corpo e na luz projetada na tela. O filme A Dama do Estácio é uma elucubração sobre o que teria acontecido com a personagem Zulmira do filme A Falecida de Leon Hirszman realizado em 1965. Este é o primeiro filme da Fernanda Montenegro e ela está lá de volta mais uma vez encarnando a Zulmira. A potência da atriz, da personagem quase cinquenta anos depois é impressionante. A voz, o movimento do seu corpo no quadro, as rugas no rosto, a mesma obsessão pela morte, marcam a passagem do tempo, mas ainda é possível vislumbrar um passado. Há ali na tela o filme do Leon, mas também o filme do Ades, há a mesma atriz que já não é mais a mesma e uma cidade que também já é outra. É neste espaço nebuloso, entre os tempos idos e o presente, que o filme habita. O próprio filme funciona como ruínas de um filme, de uma atriz, de uma cidade, com toda a potência poética e reflexiva que as ruínas nos trazem para pensar o presente. E claro, o filme não deixa de ser uma celebração do cinema, de uma atriz e do bairro do Estácio – um certo modo de ser carioca.

Às favas Nova Iorque, fico com o Estácio onde os personagens do cinema de outrora ainda podem viver seus desejos mais loucos.

Roberto Robalinho

Link para trailer do filme A Dama do Estácio: http://vimeo.com/48777089

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